Sobre meu pai eu poderia dizer facilmente que é a pessoa mais difícil que eu conheço, não é fácil ter que me ver homem de meia idade, ranzinza e teimoso.
Não é fácil ter que brigar um pouco com ele e tanto comigo mesma sempre e de novo.
É um programa de tv, é política, futebol, lugar na mesa e no coração. Gaveta aberta, luz acesa, roupa amassada -"pára de ser relaxada, menina!".
Meu pai é o que me aproxima de mim e sabe que desperta o melhor e o que tem de feio aqui dentro e lá fora.
Meu pai é a pessoa mais dura e mais coração mole que eu tenho. Talvez quem tenha tentado me preparar para os não's e buracos da vida, mesmo que ele seja sempre o primeiro a dizer sim.
Sim, eu tenho meu pai. Acho que sei disso desde uns quatro anos... "faz charminho que o papai dá". E assim eu virava o pescoço de lado e tinha o mundo, chocolates, bonecas e meu pai ao meu dispor.
Sou a filhinha dele, que estranhamente escolheu a cerveja na hora que deveria ter escolhido água com gás. Sei que isso pode ser assustador pra quem não come nem bombom com licor, mesmo assim, às vezes, ele deixa escapar um mini-riso achando graça da diferença que cresceu na mesma medida que fui crescendo.
Na hora que escolhi a tal moda no lugar do direito... Mesmo com os olhos anuviados, ele engoliu. Ao final dos quatro anos eu vi meu pai...Descabelado, descadeirado, me ajudando a arrumar as folhas da monografia, negociando preço na estamparia.
O mesmo pai que tinha me dito "bobagem moda, você não é rica", era o pai que não escondia o riso orgulhoso ao ler cada linha de um texto que ele não entende bem até hoje, era o mesmo pai que em fila de banco contava a qualquer um que pudesse ouvir da filha designer de moda "ela que escreveu o discursO da turma, quer ler>"-E foi assim que li o mesmo discurso algumas muitas vezes pra família, pra vizinhos, sempre sob o olhar atento e brilhoso como os seus cabelos de índio.
Acho que é isso, os filhos no início são historinhas infantis fáceis de se ler.Tá chorando> Deve ser cólica, ou fome.
Depois viramos contos curtos e um pouco mais emaranhados, os pais lêem e passam a ficar suscetíveis ao erro.
Quando viramos livros de mais de 500 páginas em algum dialeto perdido turco as coisas começam a complicar...
Hoje, acho que eu e meu pai caminhamos para um best-seller.
Ele ainda ri dos meus dramas, mas segura minha mão quando estou com cólicas.
Aliás, meu pai sabe como fazer meu ovo frito molinho e sem pelinha, sabe exatamente o absorvente que eu uso e sabe quando eu preciso que ele brigue comigo pra poder brigar por mim.
Quando levei a maior rasteira dos últimos tempos, ele me deu praticidade e emprestou a piada pra rir do que eu chorava tanto.
Descobri que meu pai não é super, e que ele também se machuca, ele cai e pode (incrivelmente) sangrar.
Não acredito que meu pai possa morrer, ele é dessas pessoas que vão estar sempre por aí. Sempre prontas pra próxima gracinha, briga ou implicância gratuita.
Meu pai é de longe referencial de gente boa, e ouço desde que me entendo que eu "sou todinha meu pai". Geniosos e malandros e de coração grande... Não sei isso é bom, mas é o que somos.
Ele tem defeitos, muitos... Mas, não penso em outro pai pra mim.
Tenho orgulho da pessoa que ele é e me ensina todo dia um pouco a ser.
Ainda bem que ele não vai ler isso aqui...porque sei exatamente o que ouviria:
"Escreveu textinho pro papai, dá um abraço vai!!! Dá um abraço!"
Depois, diria algo do tipo "Diodoro", é D-E-O-D-O-R-O, PAI! DEODORO!- só pra me irritar!
4 comentários:
Mas ele tem que ler!
Ficou lindo!
Deveras particuar e emocionante!
Que o meu não leia, ficará com ciúme!
ahhhhhhhh agora nao da pra comentar, to chorando. Muito.
Lindo demais.
Que bonitinhooo
Mas, vou contar pro seu outro pai que vc escreveu isso sobre meu outro pai!!!
obs:. Não sei como não temos crise de identidade, já que na infância nos diziam que tínhamos outro pai. Aliás, acho que na verdade meu pai nº 2 era seu tio, enfim... coisas que só a gente entende. rsrs
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