quarta-feira, 28 de outubro de 2009
Nosso segredo.
Quando era criança, lembro que minha mãe falava pra eu não conversar com meus amiguinhos o que conversávamos em casa.
Sempre fomos dados a coisas complexas, nada a toa eu estar estudando políticas culturais e meu irmão engenharia metalúrgica...Tudo muito complexo... Tudo muito complexo...
Não raro, quando criança, nossas discussões já giravam em torno de existência, modos de existir.
“-Existe vida em outro mundo?”
“-Existe vida aqui?”
“-Existe vida em mim?”
E, depois de tantas considerações já exauridos e a cada noite de conversas um pouco mais velhos, quando íamos dormir com o beijo de boa noite vinha o alerta maternal:
“Não se esqueça, não converse com ninguém sobre isso”.
Eu obedecia... E não entendia o porquê... Seria nosso segredo?
Teríamos nós quatro, do alto do terceiro andar do nosso apartamento, descoberto a cura da Aids, os segredos da Cia, as revelações de Maria?
Eu obedecia.
Até que um dia, inspirada por tantos questionamentos, e já lá pelos 7-8 anos... Perguntei pra mãe: “porquê?”.
Ela com olhos entendidos, como quem sempre sabe o que diz e o que sabe, mais esperta que o Google. Explicou o que nem o mesmo saberia buscar em segundos, minutos, horas... O Google não teria resultados para isso.
Minha mãe teve: “Não fale disso com seus amiguinhos, eles não entenderiam... Te chamariam de louca... Quando quiser falar mais, ser mais, questionar e saber... Conversa aqui em casa”.
Eu segui obedecendo... No colégio o papo era pique, meu nome é big primeiro, e o novo álbum de figurinhas das princesas. Em casa, era permitido Einstein, Jesus, Lincoln, Thomas Edson.
E, cresci assim... Sendo um pouco de um lado, um pouco de outro.
Querendo sempre muito de tudo.
Pergunto-me se mamãe estava certa, se eu falasse sobre essas coisas no colégio... Teria sido do grupinho decolado? Teria colado? Ido pra Porto Seguro com a galerinha mais cool?
Não sei.
Eu sei que eu fui.
Eu obedeci.
Sei que ela fez isso pra proteger e de algum jeito não deixou que a alma investigativa dos dois pequenos se cristalizasse diante de represálias de crianças do pré-escolar, que todos sabemos... Podem ser cruéis!
Ainda acho engraçado lembrar disso e do receio dela da gente não ser feliz porque sabia demais.
Hoje, as discussões não se limitam as nossas quatro paredes, falo aos quatro ventos e a algumas ventanias por aí.
Minha mão liberou.
Eu obedeci.
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4 comentários:
ah os papos lá em casa...quando eram tranquilos era melhor, mas mesmo assim continua bom...adultice aguda é fogo.
lindo!
Boa família...de repente é uma herança essa história de võcê escrever tão bem e de muitos assuntos.
beijo.
Gostei tanto da romantizada dinâmica da família Galvão!
Acho que vc poderia ter falado comigo na hora do recreio, eu nunca colecionei figurinhas!há!
"Teria sido do grupinho decolado? Teria colado? Ido pra Porto Seguro com a galerinha mais cool?"
hahaahahahhaahaa
última coisa que essa galerinha aí era: ser cool!
hahahhahahahhahah
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